Embora a presença de amor e afeto para a formação do casal sejam aspectos provenientes de séculos atuais, relacionamentos amorosos estão presentes na sociedade desde a origem do homem, amoldando-se, ao longo do tempo, a diferentes padrões, épocas e culturas.

Dito isto, certa é a existência de pessoas que se aproveitam da confiança estabelecida em relacionamentos amorosos para aplicarem golpes de ordem financeira em seus então companheiros, tal qual o ocorrido no início deste ano, na cidade de Cuiabá, no Estado do Mato Grosso, onde um homem fora condenado a indenizar a ex companheira em R$10.000,00 (dez mil reais), em decorrência da violência psicológica e do abuso da boa-fé ao contrair diversas dívidas em nome desta.

Eis aí o estelionato sentimental, caracterizado pela exploração econômica de uma das partes na constância do relacionamento amoroso, seja ele virtual ou não.

Convém ressaltar que a ajuda financeira em um relacionamento amoroso em que as partes compartilham os mesmos sentimentos é uma situação comum e legítima. No entanto, a violação dos deveres relacionados com a boa-fé (princípio segundo o qual as partes possuem o dever de agir com base em valores éticos e morais da sociedade), por meio de estratagemas para enganar ou iludir, aproveitando-se da confiança existente em uma relação amorosa, com promessas de casamento ou falseamento da verdade, caracteriza a responsabilização civil prevista nos artigos 186 e 927 do Código Civil, dada a obrigação de reparar, daquele que, por ação ou omissão, violar direito ou causar dano a outrem, mesmo que exclusivamente moral.

Desta forma, o estelionato sentimental deve ser analisado tanto sob a ótica cível, quanto sob a penal, uma vez que tal conduta encontra-se tipificada como crime, na forma do artigo 171 do Código Penal, ao prever pena de reclusão de um a cinco anos e multa, a quem obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.

O estelionatário sentimental aproveita-se do afeto e da confiança da vítima, para se beneficiar economicamente, auferindo valores com promessa de recompensa e ressarcimento futuro, ao passo que esta acredita vivenciar um relacionamento pautado em sentimentos recíprocos.

A vítima, por sua vez, na grande maioria das vezes sente-se culpada e envergonhada por expor sua intimidade ao admitir ser enganada pelo companheiro, evitando-se assim, denunciar o crime ou pleitear a indenização que lhe compete.

Tal situação se agrava pelo fato de que boa parte das vítimas desconhece a possibilidade de buscar, ante ao Poder Judiciário, a reparação civil pelos danos financeiros e psicológicos que lhes foram causados.

Para tanto, é necessário comprovar o repasse de valores e/ou bens, assim como demonstrar estar a vítima iludida em sua boa-fé e confiança, advindas do afeto simulado, concluindo-se, pois, pela possibilidade de reparação por danos materiais e morais resultantes da fraude afetiva como forma de evitar o enriquecimento ilícito e minimizar as mazelas sentimentais sofridas pela vítima.

Palavras-chaves: ESTELIONATO SENTIMENTO – RESPONSABILIDADE CÍVEL E CRIMINAL – FRAUDE AFETIVA – EXPLORAÇÃO ECONÔMICA DO COMPANHEIRO.